sábado, 26 de setembro de 2020

A Santíssima Trindade - Parte III

 

Evidências Bíblicas para a Doutrina

O Novo Testamento

João começa o prólogo do seu Evangelho com a revela­ção do Verbo:  "No princípio era o Verbo, e o Verbo estava com Deus, e o Verbo era Deus" (Jo 1.1). B. F. Westcott observa que, aqui, João leva nossos pensamentos para além do começo da Criação, no tempo, para a eternidade.12 O verbo "era" (gr. en, pretérito imperfeito de eimi, "ser") apa­rece três vezes nesse versículo e, mediante todo o versículo, o apóstolo transmite a idéia de que nem Deus, nem o Verbo (gr. Logos), tem começo; sempre existiram em conjunto, e assim continua.13

A segunda parte do versículo continua: "E o Verbo esta­va com Deus [pros ton theon]". O Logos existe com Deus, em perfeita comunhão, por toda a eternidade. A palavra pros (com) revela o relacionamento "face a face" que o Pai e o Filho sempre compartilharam.14 A frase final de João é uma declaração nítida da divindade do Verbo: "E o Verbo era Deus".15

João continua a revelar-nos que o Verbo entrou na His­tória (1.14) como Jesus de Nazaré, sendo Ele mesmo "o Único Deus, que está ao lado do Pai".16 E o Verbo tornou o Pai conhecido (1.18). O Novo Testamento revela, ainda que, pelo fato de Jesus Cristo ter compartilhado da glória de Deus desde toda a eternidade (Jo 17.5), Ele é objeto da adoração reservada somente a Deus: "Para que ao nome de Jesus se dobre todo joelho dos que estão nos céus e na terra, e debaixo da terra, e toda língua confesse que Jesus Cristo é o Senhor, para glória de Deus" (Fp 2.10,11; ver também Ex 20.3; Is 45.23; Hb 1.8).

Foi através do Verbo eterno, Jesus Cristo, que Deus Pai criou todas as coisas (Jo 1.3; Ap 3.14).17 Jesus se identifica como o soberano "Eu sou" (Jo 8.58; cf. Êx 3.14).18 Em João 8.59, os judeus sentiram-se impulsionados a pegar em pedras para matar a Jesus em virtude dessa refyindicação. Tentaram fazer a mesma coisa mais tarde depois de haver Ele declarado em João 10.30: "Eu e o Pai somos um". Os judeus que o escutaram consideraram-no blasfemo: "Sendo tu homem, te, fazes Deus a ti mesmo" (Jo 10.33; cf. Jo 5.18).

Paulo identifica Jesus como o Deus que provê todas as coisas: "Ele é antes de todas a coisas, e todas as coisas subsistem por ele" (Cl 1.17). Jesus é o "Deus Forte" que reinará como Rei no trono de Davi, e o tornará eterno (Is 9.6,7). Seu conhecimento é perfeito e completo. Pedro falou assim a nosso Senhor: "Senhor, tu sabes tudo" (Jo 21.17). O próprio Cristo disse: "Todas as coisas me foram entregues por meu Pai; e ninguém conhece o Filho, senão o Pai; e ninguém conhece o Pai, senão o Filho e aquele a quem o Filho o quiser revelar" (Mt 11.27; cf. Jo 10.15).19

Jesus agora está presente em todos os lugares (Mt 18.20), e é imutável (Hb 13.8). Ele compartilha este títu­lo com o Pai: "o Primeiro e o Último" (Ap 1.17; 22.13). Jesus é o nosso Redentor e Salvador (Jo 3.16,17; Hb 9.28; 1 Jo 2.2), nossa Vida e Luz (Jo 1.4), nosso Pastor (Jo 10.14; 1 Pe 5.4), aquele que nos justifica (Rm 5.1), e que virá em breve como "REI DOS REIS E SENHOR DOS SENHORES" (Ap 19.16). Jesus é a Verdade (Jo 14.6) e o Consolador, cujo conforto e ajuda transbordam em nossa vida (2 Co 1.5). Isaías também o chama nosso "Conse­lheiro" (Is 9.6), e Ele é a Rocha (Rm 9.33; 1 Co 10.4). Ele é santo (Lc 1.35) e habita naqueles que lhe invocam o nome (Rm 10.9,10; Ef 3.17).

Tudo quanto se pode dizer a respeito de Deus Pai, tam­bém pode ser dito a respeito de Jesus Cristo. "Em Cristo habita corporalmente toda a plenitude da divindade" (Cl 2.9). "Cristo... é sobre todos, Deus bendito eternamente" (Rm 9.5). Jesus falou de sua plena igualdade com o Pai: "Quem me vê a mim vê o Pai... estou no Pai, e o Pai, em mim" (Jo 14.9-11).

Jesus reivindicava plena divindade para o Espírito Santo: "E eu rogarei ao Pai, e ele vos dará outro Consolador, para que fique convosco para sempre" (Jo 14-16).20 Ao chamar o Espírito Santo allon parakleton ("outro ajudador do mesmo tipo que Ele mesmo"),21 Jesus afirmou que tudo quanto pode ser afirmado a respeito de sua natureza pode ser dito a respeito do Espírito Santo. Por isso, a Bíblia dá testemunho da divindade do Espírito Santo como a Terceira Pessoa da Trindade.

O Salmo 104.30 revela o Espírito Santo como o Criador: "Envias o teu Espírito, e são criados, e assim renovas a face da terra". Pedro se refere a Ele como Deus (At 5.3,4), e o autor da Epístola aos Hebreus chama-o "Espírito eterno" (Hb 9.14).

A exemplo de Deus, o Espírito Santo possui os atributos da Deidade. Ele tem conhecimento de todas as coisas: "O Espírito penetra todas as coisas, ainda as profundezas de Deus... Ninguém sabe as coisas de Deus, senão o Espírito de Deus" (1 Co 2.10,11). Ele está presente em todos os lugares (SI 139.7,8). Embora o Espírito Santo distribua dons entre os cristãos, Ele mesmo permanece sendo "um só" (1 Co 12.11); Ele é constante na sua natureza. Ele é a Verdade (Jo 15.26; 16.13; 1 Jo 5.6). Ele é o Autor da Vida (Jo 3.3-6; Rm 8.10) mediante o renascimento e a renovação (Tt 3.5) e nos sela para o dia da redenção (Ef 4.30).

O Pai e nosso Santificador (1 Ts 5.23), Jesus Cristo é nosso Santificador (1 Co 1.2), e o Espírito Santo é nosso Santificador (Rm 15.16). O Espírito Santo é nosso "Conse­lheiro" (Jo 14.16,26; 15.26), e habita naqueles que o temem (Jo 14.17; 1 Co 3.16,17; 6.19; 2 Co 6.16). Em Isaías 6.8-10, o profeta indica que Deus está falando, e Paulo atribui a mesma passagem ao Espírito Santo (At 28.25,26). No que tange a isso, João Calvino observa: "Realmente, onde os profetas usualmente dizem que as palavras que pronunciam são as do Senhor dos Exércitos, Cristo e os apóstolos as atribuem ao Espírito Santo [cf. 2 Pe 1.21]". Calvino conclui: "Segue-se, portanto, que quem é o autor preeminente das profecias é verdadeiramente Jeová [Yahweh]".22

"O conceito do Deus Trino e Uno acha-se somente na tradição judaico-cristã".23 Esse conceito não surgiu mediante a especulação dos sábios deste mundo, mas através da reve­lação outorgada passo a passo na Palavra de Deus. Em todos os escritos dos apóstolos, a Trindade é implícita e tomada como certa ( Ef 1.1-14; 1 Pe 1.2). Fica claro que o Pai, o Filho e o Espírito Santo, existem eternamente como três Pessoas distintas, mas as Escrituras também revelam a uni­dade24 dos três membros da Deidade.25

As Pessoas da Trindade têm vontades separadas, porém nunca conflitantes (Lc 22.42; 1 Co 12.11). O Pai fala ao Filho, empregando o pronome da segunda pessoa do singu­lar: "Tu és meu Filho amado; em ti me tenho comprazido" (Lc 3.22). Jesus se oferece ao Pai pelo Espírito (Hb 9.14). Declara que veio "não para fazer a minha vontade, mas a vontade daquele que me enviou" (Jo 6.38).

O nascimento virginal de Jesus Cristo revela o interrelacionamento entre os três membros da Trindade. O relato de Lucas diz: "E, respondendo o anjo, disse-lhe: Des­cerá sobre ti o Espírito Santo, e a virtude do Altíssimo te cobrirá com a sua sombra; pelo que também o Santo, que de ti há de nascer, será chamado Filho de Deus" (Lc 1.35).

O único Deus é revelado como a Trindade na ocasião do batismo de Jesus Cristo. O Filho subiu das águas. O Espírito Santo desceu como pomba. O Pai falou dos Céus (Mt 3.16,17). Por ocasião da criação, a Bíblia menciona o envolvimento do Espírito (Gn 1.2). O autor da Epístola aos Hebreus, porém, declara explicitamente que o Pai é o Criador (Hb 1.2), e João demonstra que a criação foi realizada "por meio do"26 Filho (Jo 1.3; Ap 3.14). Quando o apóstolo Paulo anuncia aos atenienses que Deus "fez o mundo e tudo que nele há" (At 17.24), a única conclusão a que podemos razoavelmente chegar (juntamente com Atanásio) é que Deus é "um só Deus na Trindade, e a Trindade na Unidade".

A ressurreição de Jesus Cristo dentre os mortos é outro exemplo notável do relacionamento dentro da Deidade Trina e Una na redenção. Paulo declara que o Pai de Jesus Cristo ressuscitou nosso Senhor dentre os mortos (Rm 1.4; cf. 2 Co 1.3). Jesus, contudo, declarou enfaticamente que ressuscita­ria seu próprio corpo da sepultura na glória da ressurreição (Jo 2.19-21). Noutro texto, Paulo declara que Deus, medi­ante o Espírito Santo, ressuscitou Cristo dentre os mortos (Rm 8.11; cf. Rm 1.4). Lucas coroa teologicamente a orto­doxia trinitariana ao registrar a proclamação do apóstolo Paulo aos atenienses de que o único Deus ressuscitou a Cristo dentre os mortos (At 17.30,31).

Jesus coloca os três membros da Deidade no mesmo plano ao ordenar aos seus discípulos: "Ide, ensinai todas as nações, batizando-as em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo" (Mt 28.19).

O apóstolo Paulo, judeu monoteísta treinado pelo gran­de erudito rabínico Gamaliel, hebreu de hebreus; segundo a lei, fariseu (Fp 3.5), deu o carimbo definitivo à teologia trinitariana, conforme revela a sua saudação à igreja em Corinto: "A graça do Senhor Jesus Cristo, e o amor de Deus, e a comunhão do Espírito Santo sejam com vós todos" (2 Co 13.14).27 Os dados oferecidos pela Bíblia levam-nos decidi­damente à conclusão de que, dentro da natureza do único Deus verdadeiro, há três Pessoas, sendo que cada uma é co-eterna, co-igual e co-existente.

O teólogo ortodoxo subordina humildemente os seus pensamentos sobre a teologia trinitariana aos dados revela­dos na Palavra de Deus de maneira bem semelhante ao físico quântico ao formular a teoria paradoxal das partículas de ondas:

Os físicos quânticos concordam entre si que as entidades subatômicas são uma mistura de propriedades de ondas (W), de propriedades de partículas (P), e de propriedades quânticas (h). Os elétrons de alta velocidade, ao serem atirados através de um filme metálico, ou de cristal de níquel (como raios catódicos rápidos ou até mesmo como raios-B), difratam como raios-X. Em princípio, o raio-B é igual à luz solar empregada numa experiência de dupla ranhura ou biprísmica. A difração é um critério de comportamento semelhante a raios nas subs­tâncias; toda a teoria clássica das ondas baseia-se nisso. Além desse comportamento, porém, há muito tempo que os elétrons vêm sendo considerados partículas com carga elétrica. Um campo magnético transversal defletirá um feixe de elétrons e seu padrão de difração. Somente as partículas comportam-se dessa maneira; toda a teoria eletromagnética depende disso. Para explicar todas as evidências, os elétrons devem ser tanto partículas quando ondulatórios [grifos nossos]. Um elétron é um Pwh.28

A analogia entre a Trindade e o Pwh ilustra muito bem as precauções preliminares desse capítulo, ou seja: embora o teólogo sempre deva esforçar-se por conseguir a racionalidade na formulação teológica, ele também deve preferir a revela­ção às restrições finitas da lógica humana. A Escritura, e tão­ somente ela, é o ponto de partida para a teologia da Igreja Cristã.

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